A dor de nossos irmãos gaúchos

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04.07.2024 - 10:00:00 | 4 minutos de leitura

A dor de nossos irmãos gaúchos

Foi uma surpresa geral, daquelas que nunca esqueceremos. Cada um de nós se lembra da maneira como reagiu ao tomar conhecimento dos acontecimentos ocorridos no Rio Grande do Sul, no último mês de maio. É difícil expressar o que cada um sentiu enquanto as águas tomavam conta daquele estado sulino. Como definir os sentimentos? Surpresa? Medo? Tristeza, pela morte de crianças e adultos? Sofrimento, ao ver que muitos estavam perdendo seus bens, resultado do trabalho de toda uma vida? Uma dor que parecia não ter fim tomou conta de nosso país. Cada qual queria fazer alguma coisa, desejava expressar sua solidariedade com aqueles irmãos, assegurar carinho e presença junto a quem sofria – mas, de que maneira?...

Depois da surpresa, vieram outras perguntas: Como aconteceu? Era inevitável que acontecesse? Poderá acontecer novamente? Surgiram explicações de técnicos e autoridades, e multiplicaram-se reportagens da Imprensa. Num ponto, todos estavam de acordo: trata-se de um fato de gravidade imensa, triste demais para poder ser avaliado profundamente em poucas semanas ou meses.

Momentos como esse têm o dom de nos fazer testemunhar gestos de amor e solidariedade que não vemos no dia a dia. Consola-nos ver que as pessoas têm um imenso potencial de bondade, a ponto de multiplicarem iniciativas para atender ao maior número de pessoas. Momentos assim fazem renascer em nós a esperança no ser humano. Tomamos consciência, por outro lado, que o homem moderno, responsável por tantas descobertas e invenções, não consegue inventar uma máquina que cure as feridas do coração.
O que a fé nos ensina sobre isso?  Qual o olhar de Jesus sobre o que aconteceu no Rio Grande do Sul? Que respostas nós, seus discípulos, temos para oferecer às pessoas, famílias e comunidades atingidas pela tragédia?

Começo pelo que é fundamental: Deus não quer o sofrimento de ninguém. Seria um absurdo dizer ou pensar que o que aconteceu era da vontade de Deus. Deus é amor! Seu Filho Jesus desejou que a sua alegria estivesse em nós, e que a nossa fosse completa. Mas, então, onde encontrar uma explicação para tanta dor? Sabemos que há sofrimentos que nascem de descuidos – por exemplo: a criança que se queimou porque ninguém percebeu que ela brincava com fogo ou que estava próxima de um fogão. Há sofrimentos que nascem do coração humano, que premeditadamente deseja fazer o outro sofrer. Há sofrimentos que surgem de omissões ou irresponsabilidades: não foi feito o que deveria ter sido feito como prevenção, ou foi feito de forma errada. Há sofrimentos que são fruto de comportamentos irresponsáveis: o jovem que se excede na bebida, entra em seu carro, dirige a 160km por hora e acaba matando pessoas inocentes. Por fim, há sofrimentos causados pela natureza: a ação de um tsunami, a erupção de um vulcão, a devastação causada por um ciclone ou por uma tempestade interminável, como a que ocorreu no estado gaúcho. Nesse caso, nasce a necessidade de se multiplicar iniciativas para que uma tragédia como essa não se repita, ou não tenha tais proporções. Uma dessas iniciativas diz respeito à natureza: muito do que acontece tem como causa a falta de respeito pelo seu equilíbrio e que leva à sua sistemática destruição. Diz a sabedoria popular: “Deus perdoa sempre; o homem, nem sempre; a natureza nunca perdoa”. Assim, não a respeitando, paga-se um alto preço por isso.

Um dos dons mais preciosos que Deus nos deu é o da liberdade.  Criando-nos livres, Ele nos deixa fazer escolhas que podem ser certas ou erradas; permite-nos tomar decisões, mesmo que sejam motivadas pelo egoísmo, pela avidez do lucro ou pelo comodismo – decisões que poderão, inclusive, prejudicar pessoas, grupos e até multidões. Ao nos criar livres, o Senhor nos tornou responsáveis por nossos atos e omissões. Um dia responderemos pelo bom ou mau uso que tivermos feito de nossa liberdade.

O apóstolo Paulo lança uma luz sobre o que estamos refletindo: “Tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8,28). “Tudo” – também, pois, os sofrimentos que nasceram e se multiplicaram no Rio Grande do Sul, e deram origem a uma dor nacional. Que Deus nos ajude a tirar lições, principalmente uma que é fundamental: quando um irmão sofre, devemos fazer nosso o seu sofrimento, e estender nossas mãos para ajudá-lo no que pudermos.

Fonte: Dom Murilo S. R. Krieger, SCJ
Foto: Ministério da Defesa
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